Esse
apartamento vai ser minúsculo para todos nós, mas o fato é que eu não tenho
ninguém pra reclamar. Estou sentado nesse sofá há quase meia hora... Viro os
olhos pra porta, mais uma vez. Se alguém do lado de fora olhasse para aquele
pedaço de madeira velha diria que o lugar devia estar abandonado há décadas.
Imagino quantos viciados já não morreram tentando arrombá-la, sem se importar
com as linhas de tinta descascada, estampando na madeira a cara do demônio.
No
outro sofá, um homem careca ronca alto, fazendo subir e descer a barriga
arredondada. Gerrard era coveiro, antes de Acordar. Os sapatos e as calças
surradas, a camisa mal abotoada, as joias de bicheiro e o sorriso fácil desse
homem fazem com que muitos achem que o conhecem, que ele é só um cara legal, mal vestido e bem humorado. Nem suspeitam da frieza daqueles olhos de cadáver. Às vezes eu
tenho medo do Gerrard.